Voltei e cheguei a Carachi... ao mesmo tempo...

Voltei há quase 3 semanas... Estive quase dois meses fora, se é que "estar fora" se aplica. Como se decide "estar fora" entre o local onde fica o coração e o local onde vivemos? Como se decide "estar fora" quando deixamos de ter o preto e o branco e nos movimentamos entre matizes de cinzento? Como se decide "estar fora" quando parece que estamos sempre fora, ou sempre dentro, ou sempre algures?

Voltei há quase 3 semanas a Carachi. Para trás ficaram quase dois meses de Portugal. Repartidos entre a serenidade familiar na agora centenária cidade de Abrantes; entre o calor das novas amizades lavradas em Tomar; entre a doçura de rostos das boas gentes do Porto; entre a vivacidade e o bulício da minha querida Lisboa. Foram quase dois meses em que queria sentir-me dentro, sabendo que parte de mim já estava fora. E quando chegasse "lá fora" uma parte ficaria ali dentro.

Voltei há quase 3 semanas a Carachi, mas foi como se chegasse de novo. É tudo diferente. Parti de Carachi, no começo de Junho, como Professor, apenas para regressar como Coordenador, nos primeiros dias de Agosto. Não fui o único a partir. Três colegas seguiram para novos "foras", novos rumos. E três novos rostos ocuparão o seu lugar. Uma chegará hoje...

Voltei há quase 3 semanas a Carachi, a essa Carachi onde nunca chovera, e logo começou a chover. Como se os céus me quisessem dizer que não há repetições; que não cheguei para um remake mas para um novo episódio. Estou no mesmo espaço, mas num momento diferente. E por isso se é certo que voltei a Carachi, não é menos certo que só cheguei a este momento agora.

Voltei ao mesmo quarto, no segundo andar, no corredor direito, com o número 9 na porta. Mas o número 8, que albergava um desses colegas, repousa agora num silêncio incomum. Num silêncio que torna tudo isto novo, apesar de tudo permanecer semelhante no número 9. Nada permanece igual, quando somos feito de movimento e de emoções. Eu sei que o igual é uma ilusão, criada apenas para dar conforto. Mas por vezes o ilusório conforto é tudo o que basta...

Voltei ao mesmo quarto, no segundo andar, no corredor direito, com o nímero 9 na porta. Mas trouxe comigo novos rituais. Chá com mel do norte do Paquistão aos sábados e café, que trouxe de Portugal, aos domingos. Trouxe para o mesmo quarto, rotinas novas. A serenidade da leitura ou o ócio constante entre a poltrona amarela e a cadeira preta, substituídas por corridas, e agachamentos e flexões e sei lá mais o quê!

Voltei e cheguei a Carachi, ao mesmo tempo. Pronto para experimentar o novo, neste espaço que já conheço mas que me reserva o desconhecido. Voltei e cheguei para recomeçar, mas não para repetir. E apesar da incerteza ser a única certeza sinto-me confortado. Se fosse para remakes ficava na centenária Abrantes num loop de carinho familiar; ou deixava-me pelo Porto num carrousel de aventuras; ou quedava-me por Lisboa...

Voltei há quase 3 semanas a Carachi, mas não vi em busca do que já foi mas do que poderá ainda ser.  Porque sei que não sabendo ao certo onde é o meu "estar fora", acabo por estar sempre dentro; por estar sempre num espaço que é meu e não é meu, porque o espaço a ninguém pertence. Voltei em busca de mais peças para entender o puzzle que sou. E amanhã começa mais uma semana...


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