Tupou VI e o milenar Reino do Tonga

O Reino do Tonga assistiu ontem à glamorosa cerimónia de coroação do Rei Tupou VI. O acto de ontem foi (na verdade) apenas uma (algo tardia) confirmação simbólica do desempenho de funções de Chefe de Estado que o Rei Tupou VI começou a 18 de Março de 2012, após a morte do seu antecessor o Rei Jorge Tupou V.

E porque interessa isto ao  Fidalgo? Para começar, para um monárquico convicto como o Fidalgo qualquer entronização é sempre motivo para festejo. O respeito pelos símbolos da Nação, a preservação da memória e a ideia de que existe continuidade são pilares essenciais dos regimes monárquicos. Isso e um amor do/a Chefe de Estado pelo povo, que muitas Repúblicas não conseguem entender...

O Reino do Tonga é um arquipélago composto por 177 ilhas, das quais mais de 50 não são habitadas. O Tonga, apelidado por James Cook como "As Ilhas Amigáveis", é um dos poucos Estados no Pacífico que nunca perdeu a soberania para qualquer potência estrangeira. No Sudeste Asiático somente a monárquica Tailândia se pode gabar do mesmo.

Vamos lá a um pouco de História. O Tonga unificado existe apenas desde 1875, quando o Rei Jorge Tupou I subiu ao trono, começando a dinastia Tupou. Antes desta dinastia três outras dinastias já antes tinham ocupado o trono, que não fica sem candidato desde, pelo menos, o século X. Isso mesmo, mais de 1000 anos de continuidade.

Antes da dinastia Tupou, o trono do Tonga encontrava-se nas mãos dos Tuʻi Kanokupolu. Esta dinastia governou o Tonga desde o começo do século XVII até meados do século XIX. Só depois Jorge Tupou I subiu ao trono, operando uma unificação complexa do Tonga, que então mergulhara num clima de guerrilha civil maquinada pelas potências estrangeiras: Reino Unido e Países Baixos.

Tuʻi Kanokupolu chegam ao poder com a queda dos Tuʻi Haʻatakalaua. Esta dinastia chega ao poder do Tonga por volta de 1470 até finais do século XVI. O primeiro monarca dos Tuʻi Haʻatakalaua chega ao poder para vingar a violenta morte do seu paí, último líder dos Tu'i Tonga. Na transição do século XVI para o século XVII assiste-se a uma transição de poder, nem sempre pacífica, de uma dinastia (Tuʻi Haʻatakalaua) para a outra (Tuʻi Kanokupolu).

A primeira dinastia do Tonga é então a Tu'i Tonga, da qual existem registos que datam desde o século X até à transição operada em 1470. Este é o período do Império Tonga! Curiosamente, o primeiro Rei da segunda dinastia (Kauʻulufonua I) era filho do último Rei da primeira dinastia (Takalaua), o que leva alguns historiadores e entusiastas (como o Fidalgo) a dizer que as duas dinastias são na verdade uma.

Mais! O último Rei da segunda dinastia e o primeiro Rei da terceira dinastia eram irmãos, o que, uma vez mais, mostra continuidade na linhagem real. E o primeiro Rei da quarta dinastia (George Tupou I) é filho do penúltimo Rei da terceira dinastia (Tupouto'a). Ou seja, existem laços de consanguinidade nos governantes do Tonga que vão desde o século X até ao século XXI.

Isso por si só não chega para provar o valor de algo, bem sei, mas traduz bem esta noção de continuidade. Os governos cumprem a noção de governos temporais, limitados, com poder governativo no curto e médio-prazo. Mas o Rei é o guardião do Passado e o garante do Futuro; aquele que consegue planear a longo-prazo, porque está acima do jogo político. 

O novo Rei do Tonga celebra esse encontro do Passado e do Futuro. O novo Rei representa uma linhagem milenar, que se estende por quase onze séculos e ao mesmo tempo já anunciou que o arquipélago se prepara agora para um necessário período de aprofundamento da democratização do regime, que passará a ser uma Monarquia Constitucional Parlamentar.

O novo Rei do Tonga permite aos tongoleses uma certeza de que fazem parte de uma comunidade com continuidade multissecular. É um garante de tradição e de certeza, num mundo cada vez mais repleto de incertezas e em que tudo se parece mover cada vez mais depressa. Longa vida ao Rei do Tonga e, quem sabe, um destes dias poderemos dizer o mesmo em Lisboa...

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