Saudades de ter saudades

Agosto foi mês de pausa para o Fidalgo. Não que o mundo não tenha provido notícias, com o adensar da guerra civil na Ucrânia, com o avanço do Estado Islâmico do Iraque e da Síria, com as campanhas pró-independência na Escócia e na Catalunha... Temas não faltaram, mas o Fidalgo achou por bem fazer uma pausa. A sua pausa!

E regressa hoje, depois de ontem ter regressado a Kırıkkale, e de no dia anterior ter regressado à Turquia. Uma cadeia de regressos, que fez também regressar aquela que nunca partiu: a Saudade. E enquanto desempoeiro o estilo e a prosa, vou percebendo como tinha Saudades de ter Saudades. E, sem pensar muito, sorrio.

O mês de Julho foi intenso, com conferências e reuniões de trabalho em Nantes, Novi Sad, Belgrado e Lisboa. O mesmo, antes de encerrar, trouxe o final do ramadão e do ciclo de trinta dias de jejum que me propus, e que consegui, fazer; trouxe ainda o "casamento dos anos": 28 a 28. E por isso, inebriado pela intensidade dos dias, a Saudade tornou-se memória espectral de um algo que sentira...

Agosto trouxe amizades e rostos que conheço. Mas trouxe também trabalho, em catadupa, que isto da vida intelectual tem muito mais de isolamento do que de glamour. As viagens a Conferências, Seminários, Fóruns, Cimeiras e afins são o final da estrada, mas para lá chegar é preciso caminhar a estrada. Agosto trouxe Portugalidade, num país com Verão a meio-gás!

As Saudades estavam lá. A dormitar... Iam espreitando quando podiam. Dei-me por mim, mais do que uma vez, a pensar com sorridente nostalgia no que deixara para trás, em Kırıkkale, em Ankara, em Konya para seguir para a frente; para Abrantes e para Lisboa. As saudades atacaram quando pensava no Porto, em Évora, em Albufeira, em Aveiro e em Estarreja mas com estocadas suaves.

E o Tempo, que nunca domaremos por muito refinado que seja o relógio, avançou. Agosto findou-se e o vislumbre da Turquia, de voltar ao que ficara para trás, deixando para trás onde agora ficara, deu ímpeto às saudades. Fui fazendo as malas sem pressa, como se isso atrasasse o Tempo. Manias fúteis de quem sabe que o Tempo não se atrasa.

Fui organizando o novo ano lectivo, com a paixão de quem ama o que faz, mas com a vagareza de quem quer embalar as Horas e encantar os Segundos, nem que fosse para ganhar dois Minutos... Mas o Tempo seguiu imperturbável e eu segui com ele. Não tinha mais a fazer... E Abrantes ficou para trás, Lisboa seguiu-se-lhe e cheguei a Kırıkkale, que antes também ficara para trás.

E quando o Fidalgo regressa, depois de ter ficado para trás, percebo que tinha saudades de ter Saudades. Porque elas enchem o coração, ocupando o espaço que seria da Tristeza; porque elas, as Saudades, dão certezas de Futuro, recorrendo ao Passado, para superar o Presente. São dolorosas, mas carinhosas. E por isso sim, tinha saudades de ter Saudades.

É sina de qualquer português ter saudades? Sim, e ainda bem que assim é. Porque quando deixamos de as combater, passamos a entendê-las. As lágrimas continuam a rolar pelo rosto quando ouvimos a voz de quem nos ama; o aperto do coração não pássa ao ver aquela foto, daquela pessoa; mas as Saudades sussurram promessas de um amanhã, igual ao ontem desde que se supere o hoje.


Comments

Unknown said…
Em breve vou saber o que essas palavras significam.
Um grande beijinho amigo