O fim da jornada, ou um novo começo...

A 27 de Junho decidi fazer o jejum do Ramadão, mais por solidariedade e por curiosidade cultural do que por qualquer outra razão. Decidi cumprir os preceitos do jejum do Ramadão, que implicam total abstinência de água, comida, tabaco, sexo, por um ciclo de vinte e quatro horas para entender melhor mas não completamente porque jejuam os muçulmanos.

E ao final do primeiro dia, complicado pelas privações e pelo lento desfiar das horas, decidi fazer mais um dia. E aos poucos o que era um desafio pontual, tornou-se numa maratona em que o corredor não tem que se mover para chegar à meta. Uma maratona em que o importante é não-fazer; uma maratona em que correr não leva a lado nenhum.

E aos poucos o que era um desafio, um mero espreitar e sentir a cultura islâmica, passou a ser parte de mim. Ao jejum adicionei o diálogo comigo mesmo, com a minha alma, com os meus Egos (que isso de ter só um Ego parece-me pouco!). Ao jejum adicionei o diálogo com o Divino, não lhe dando um nome, porque o Divino tem vários... e nem todos de tónica masculina...

O jejum, a privação de comer e beber, trouxe alimento espiritual. Enquanto esperava pelo iftar fui-me alimentando de palavras, de sonhos, de ideias, de pensamentos. Fui-me alimentando de mundo, porque há muito que tinha fome dele... Mesmo sem sentir. O jejum mostrou-me como nos deixamos inebriar pelo acessório, pelo anexo, pelo supérfulo...

Não foi preciso jejuar para dar valor à comida e a tudo o resto, mas só jejuando percebi o total valor de tudo o que temos com facilidade. Do mundo priveligiado em que nasci e no qual, apesar de todos os precalços, podemos viver e não apenas sobreviver. O jejum do ramadão tornou-se assim não apenas numa experiência cultura, mas numa verdadeira escola em que o Mestre e o Aprendente se fundiram!

E ontem à noite terminou tudo! Conheci um egípcio que, pela sua fé, passava pelas mesmas provações que eu passara, por querer apenas conhecer mais. Um egípcio que, com um sorriso solar, fez questão de partilhar o seu iftar comigo. Nada de muito luxuoso, duas sandes de queijo, um sumo e duas peças de fruta. Partilhámos! E a jornada findou...

E hoje que se celebra o meu nascimento sinto que o mais importante é aplaudir esta jornada. No ano em que caso os anos, renovei-me ao alimentar-me de mundo quando tudo o mais estava auto-proíbido. Curioso como o ramadão, este ano, termina na noite em que se começam a celebrar os meus 28 anos, a 28 de Julho... Curioso como as coisas fazem mais sentido, quando não procuramos forçá-lo.

Foram trinta dias que ainda não compreendo; trinta passinhos que dei sem saber para onde; trinta ciclos que completei sem razão, para além da vontade, do querer. Não sei se repetirei a experiência para o ano, não é importante, mas sei que este ano fiz o jejum do ramadão e sei que com o mesmo o Tiago dos 28 anos é bem diferente do que tinha 27 anos...


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