Manual de como (Não!) admitir novos membros...

Imagine que funda um Clube de Leitura. E define os membros desse Clube de Leitura têm que gostar de policiais, vestir verde às quartas-feiras e beber whisky. Nos primeiros tempos recebe membros que gostam de policiais, vestem verde em quase todas as quarta-feiras e apesar de não serem fãs de whisky fingem gostar da bebida... Fecha os olhos para evitar desconforto!

E depois surge um candidato ao Clube de Leitura que só lê romances históricos, que veste azul às quartas-feiras e que apenas bebe vodka. O Clube de Leitura, naturalmente, rejeita a candidatura e faz uma série de recomendações caso o candidato queira mesmo ser membro. O candidato finge interessar-se pelas recomendações, mas pouco muda... Seria de esperar que nunca entrasse no Clube...

Surpresa! De súbito alguns membros do Clube de Leitura, que se fundou sobre certos valores, acham importante a integração do membro que não respeita qualquer dos preceitos basilares do Clube. Um dos membros tenta opor-se e no final, para fingir que todos rumam no mesmo sentido, lá consente uma desvirtuação do Clube...

É assim que o Fidalgo vê a adesão oficial da Guiné Equatorial à Comunidade de Países de Língua Portuguesa, vulgo CPLP. A CPLP foi criada para sedimentar laços diplomáticos entre países de língua portuguesa (os tais policiais do Clube!). Mas a Guiné Equatorial não tem o Português como língua, o que de resto se viu ao anunciar a adesão à CPLP em espanhol, inglês, francês... E o Português? Ups!

A Guiné Equatorial não cumpriu qualquer meta na promoção e ensino do português. A antiga colónia de Espanha entra assim na Comunidade de Países de Língua Portuguesa, sem que a população fale português. Ou seja, num Clube em que se lê policiais entra um membro a ler romances históricos. Será só o Fidalgo a achar isto estranho?

E o direito à diversidade de Leitura, a gostar de algo diferente? Neste caso, não se aplica... Se se gostam de outros géneros, procurem-se outros Clubes de Leitura. A adesão à CPLP é facultativa, por isso quem entra devia respeitar as permissas basilares da organização. Ou ainda se corre o risco de a CPLP criar uma aula portuguesa-ó-céptica no seu seio.

A Guiné Equatorial, é certo, foi colónia de Portugal entre 1474 e 1778 (quando D. Maria I cede os direitos a Carlos III de Espanha) mas dificilmente consegue demonstrar um sentimento de forte lusofonia. A lusofonia é algo difícil de categorizar, que leva a tensões entre os vários membros, mas que se sente... A Guiné Equatorial não o sente e é por isso que veste azul, quando no clube todos vestem verde...

A Guiné Equatorial é um dos regimes ditatoriais mais repressivos de África e que menos respeita os direitos humanos. E se é verdade que a ideia de democracia em Luanda não é levada à letra, não é menos verdade que o esforço de Luanda não se pode comparar ao passivismo de Malabo. Por Angola existem progressos e vontade de operar mudança; pela Guiné Equatorial não.

Para o Fidalgo a Guiné Equatorial poderia ser, como era desde 2006, um Observador Associado. Ou seja, um leitor de romances históricos, que veste azul e bebe vodka, que visita um Clube de Leitura centrado em policiais e que, um dia, poderá desenvolver apetite por policiais e vestir verde, enquanto bebe whisky... Mas a admissão como membro de pleno direito tem tanto de cómica (pela irrazoabilidade) como de trágica (pelo que simboliza)!

A entrada da Guiné Equatorial salda-se assim numa manobra diplomática de Luanda e Brasília que querem mostrar a Lisboa que são mais fortes. E Lisboa, para não aparecer isolada, acedeu... Porque no final o importante é dar uma ideia de unidade, mesmo que essa unidade seja em torno de uma desvirtuação completa do sentido original da CPLP.

O Fidalgo aguarda agora para ver qual o próximo membro a entrar para a CPLP. Senegal? Maurícias?  Georgia? Namíbia? Japão? Turquia? Num Clube em que a regra é gostar de policiais, vestir verde às quartas-feiras e beber whisky mas em que quem gosta de romances históricos, veste azul e bebe vodka também é admitido sem reservas pode esperar-se tudo... menos seriedade...


Comments