Pois é Eliseu, um cidadão enganado, é um eleitor revoltado...

Tocaram as sirenes pelo Eliseu! As eleições municipais em França pulverizaram o Partido Socialista de Hollande que, sem ter celebrado dois anos de chegada ao poder, soma já a pior derrota eleitoral do PS Francês em muitos anos. O Eliseu não foi por isso de meias medidas prometeu uma baixa de impostos até 2017 e fez cair o governo de Jean-Marc Aryault.

A escolha do sucessor, Manuel Valls, demonstra um interessante sentido de humor político do Presidente da República França: numas eleições marcadas pela súbida impressionante da Frente Nacional (Extrema-Direita), o Eliseu confia num naturalizado (Valls nasceu em Barcelona, naturalizando-se com vinte anos) para constituir um "governo de combate" que tire a França do marasmo económico...

Curiosamente, não é de Arayault (Primeiro-Ministro exonerado) a culpa maior do resultado eleitoral arrasador, mas de Hollande. Ora vejamos! Antes de chegar ao Eliseu, Hollande prometeu combater a austeridade-tecnocrática e prometeu fugir ao caminho dos cortes, cortes, cortes que se aplicam em Atenas, Madrid, Roma, Lisboa, Dublin.

Prometeu mas não cumpriu. Após a eleições e abraços com uma França a caminho da ruptura financeira e sob ameaça de corte de ratings (essa arma de destruição massiva, nas mãos das três agências que sediadas em Nova Iorque continuam a fazer joguinhos políticos e não avaliação séria de riscos), Hollande foi obrigado a reformular e a dar o dito por não dito. Os cidadãos não gostaram; os eleitores vingaram-se!

Hollande prometeu assumir-se como contraponto ao excessivo poderio de Berlim; assumindo-se tacitamente como um Cavaleiro dos que se recusam a uma vassalagem cega à auto-nomeada Imperatriz da União. E também aqui falhou, tendo-se de resto apagado muito no panorama internacional. É muito claro que a França com Hollande é menos poderosa, do que a França de Sarkozy!

A França de Sarkozy foi um elemento central no apaziguamento da Guerra Russo-Georgiana de Agosto de 2008. Sarkozy colocou Paris no mapa político, não apenas por receber as negociações em Paris mas pela sua proactividade política. Berlim e Bruxelas pouco apareceram numa foto, em que Moscovo-Tbilisi-Washington-Paris foram as estrelas maiores.

A França de Hollande pouco mais fez, durante a crise Russo-Ucraniana, do que ser anfitriã das negociações para a paz. Hollande pouco se viu e pouco se ouvir, para além do protocolar e diplomaticamente estabelecido. Paris passou de palco e actor da política internacional; a albergue dos grandes líderes, numa fota em que Moscovo-Washington-Berlim foram as grandes estrelas com Bruxelas-Paris-Kiev-Nova Iorque (ONU) a fazerem fraca figura.

Hollande não só descumpriu com a palavra, como revelou uma preocupante falta de carisma junto da população francesa. O Presidente de uma República (não tendo nunca o elán de um monarca) deve ser acarinhado pela população, ou pelo menos respeitado pela mesma. Hollande tem revelado níveis de popularidade extraordinariamente baixos, que dizem muito da sua fraca performance presidencial.

A somar a um Hollande que talvez não tenha sido talhado para o cargo, adicionou-se uma direita (a UMP) inteligente, que soube colher os frutos de ser Oposição. Discursos inteligíveis, com propostas concretas, com algum rojo e a apontarem constantemente o dedo contra o Eliseu galvanizaram o eleitor a dar uma nova oportunidade ao partido, onde Sarkozy já foi (e se perfila para voltar a ser) suserano!

E depois a Frente Nacional! O arrepio dado pela Frente Nacional não surpreende, mas assusta um pouco. A Frente Nacional, como eu já disse antes, soube "civilizar-se". Vestiu um belo fato de corte francês; envelopou o discurso em veludo e usou protagonistas com carisma, capazes de diluir tensão e de transformar horror em clamor. A Frente Nacional revelou-se muito estratégica nas suas escolhas e pode reforçar o seu capital político já em Maio.

A França pós-eleições municipais não voltou apenas à direita. Esta França deu um grande cartão vermelho a Hollande por ter prometido um mundo, que (muitos disseram) sabia que não poderia cumprir. A direita foi inteligente, a extrema-direita soube construir a sua táctica, mas a culpa é da demagogia do PS de Hollande e da incapacidade de se ser honesto, porque o populismo bacoco traz mais votos.

O problema é que os votos são como as estações. Vêm e vão... E um cidadão enganado é um eleitor revoltado. E um eleitor revoltado mais do que dar vitórias, proporciona derrotas. E das grandes! Agora é esperar para ver o que pode o Eliseu fazer, para evitar novo desaire em Maio. O Fidalgo aguarda!


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