Nem desapontado, nem desiludido, mas farto!

Foram ontem conhecidos os resultados do Concurso Individual de Doutoramento e Pós-Doutoramento da FCT. O concurso aberto em Julho inicia o seu término em meados de Janeiro (ainda haverá lugar a audiência prévia e a um período formal de reclamação de nota), demonstrando a morosidade de um processo com contornos pouco claros.

O Fidalgo gosta de honestidade. Fui bolseiro de Doutoramento da FCT no período Outubro 2008 a Setembro 2012. Tenho em crer, de resto, não apenas pela minha experiência mas pelo que vou vendo e ouvindo, que tive imensa sorte nesse ano. Vejo, para minha tristeza, que o mérito teve pouco que ver com a aprovação do meu projecto.

Se o mérito ditasse as regras, nada explicaria porque razão em 2008 um aluno de Licenciatura em Comunicação Social conseguia uma bolsa em Ciência Política; e em 2012 e 2013 um Doutorando e consecutivamente Doutorado em Relações Internacionais não consegue a mesma proeza. Agradeço imenso a quem me aprovou o projecto em 2008, mas não entendo a lógica... Aposta-se num jovem investigador e quando ele pode dar algum retorno ao país tira-se-lhe o tapete? Acho estranho...

O jovem que ganhou a bolsa em 2008 tinha 0 publicações e 0 apresentações em conferências. O jovem (porque agora usa-se o título de jovem ad eternum) que não consegue a bolsa em 2013 tem quase uma dezana de publicações e mais de quatro dezenas de comunicações em conferências, cimeiras, fóruns e afins. Mas deixemo-nos de falar do Fidalgo, que o Fidalgo há muito se conformara com este desfecho...

Porque razão o país quereria investir num projecto de pós-Doutoramento com a pretensão de estudar a longínqua e (para certas iluminárias da Academia) exótica Ásia Central? Porque razão um país, abraço com uma situação financeira periclitante, quereria um estudo sobre uma das regiões do globo com maior potencial económico no médio-prazo? Estes jovens têm cada ideia...

Mas então, pergunta o Fidalgo, porque razão o país em estado de "excepcionalidade" se dá ao luxo de atribuir três bolsas (em Ciência Política) a investigadores estrangeiros, a residirem fora do país e duas bolsas a investigadores nacionais? O estado de excepcionalidade não seria justificativa suficiente para se atribuirem bolsas apenas aos investigadores nacionais?

Não pense o leitor que este é um ataque à internacionalização da Academia portuguesa; ou um argumento lançado por um proto-xenófobo. Bem longe disso... Sou a favor da internacionalização da Ciência que se produz em Portugal, mas também sou a favor de alguma equidade. E equidade, senhores, é tudo o que não consigo ver neste caso...

Eu explico! O ano passado concorri a uma bolsa num Instituto Público da Noruega. A meio do processo recebi um email a anunciar que "por culpa de restrições orçamentais", a vertente internacional do concurso ficaria suspensa. Apenas os investigadores noruegueses seriam tomados em conta. Achei muito bem! Ora se a Noruega, que não me consta esteja sob resgate, faz isto... Porque não faz a FCT, num país abraços com um programa de ajuda financeira, o mesmo?

Mas há mais! O Concurso Individual de Doutoramento e Pós-Doutoramento da FCT continua a pautar-se por um secretismo, quase místico, inexplicável. Todos os anos os resultados não são tornados públicos e o pouco que os candidatos conseguem saber é o nome de quem venceu. Porque não se disponibilizam os títulos e as sinopses de todos os projectos a concurso? O que tem a FCT a esconder? Se o dinheiro usado é público, porque não pode o público saber em quem está a investir?

A coisa parece-me ainda mais grave, quando o ano passado o bravo Samuel Paiva Pires conseguiu ir à Comissão Parlamentar de Educação Ciência e Cultura expor o pântano dos concursos da FCT e a mesma Comissão tentou "sensibilizar" a FCT para o caso com uma interpelação a várias entidades. Ora vendo que nada mudou, que tudo ficou exactamente na mesma, parece-me uma grave falta de respeito institucional da FCT para com o Parlamento. Ou a FCT está acima do Parlamento e não deve contas a ninguém?

A FCT caminha, para minha tristeza, para uma triste implosão sobre si mesma. Porque felizmente não detém o monopólio da investigação, a FCT acabará por ser ultrapassada por uma série de entidades nacionais e internacionais (estas últimas muito mais ávidas de captar talento) e tornar-se-á em algo risível. Isto se, no médio-prazo, ainda for visível de todo...

Curioso, como a mesma FCT que tinha a nobre missão de fazer despoletar a Ciência (e o gosto pela mesma) em Portugal, está a promover uma fuga de cérebros qualificados e a implosão (parcial, para já) da investigação feita em solo nacional. É este o sistema de investigação que o Sr. Ministro e seus comparsas querem para Portugal? Um sistema meio-podre, meio-pobre e meio conseguido?

Este post esteve para não ser escrito, mas estou a ficar farto de ver os meus colegas serem forçados a fazer o que fiz: migrar. Estou a ficar farto de ver investigadores fantásticos terem que fazer as malas, por culpa da tacanhez e da falta de escrúpulos de um ninho de ratos que comanda o sistema. Estou a ficar farto de ver sonhos e projectos esmagados pela crueldade desonesta de um sistema tecnocrático inoperante! Não estou desapontado, nem desiludido (ilusões tive-as o ano passado!), mas estou farto!

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