Semantica revolucionária

Por estes dias, em que muito tem acontecido, o Fidalgo andou pelo Centro Ismaili de Lisboa (espaço que tem um charme muito próprio) por causa do Fórum Lisboa 2012. O tema da edição deste ano podia traduzir-se "A Estação/Época Árabe - Das Mudanças aos Desafios, Dois Anos Depois"! E logo aqui começaram os problemas do conflito (eterno!) entre o que se diz e o que se quer dizer.

Mais do que um dos oradores convidados fizeram questão de sublinhar que a Estação/Época Árabe (antiga Primavera Árabe) está ainda em curso em todos os países por ela afectados, sendo precipitado se não mesmo incorrecto usar o vocábulo Depois (after, na versão anglófona). Mesmo na Tunísia, que começou o movimento de transformações políticas, não se reclama estar-se já numa fase pós-transicional.

Para Paulo Portas, Ministro dos Negócios Estrangeiros, que discursou no primeiro dia a mudança de Primavera Árabe para Estação/Época Árabe é muito fortuita. A ideia não é, de resto, nova! O Fidalgo ouvira o Sr. Ministro dizer o mesmo no encerramento do 16º Seminário da Juventude Portuguesa do Atlântico. O problema para nós, lusa gente, será a tradução da palavra em causa, uma vez que Season (ou no original francês Saison) pode traduzir-se como Estação, Época, Temporada ou Período.

Sem resolver o problema da Estação/Época/Temporada (não gosto muito do termo Período!) Árabe saltamos para a questão seguinte. Onde ocorreram as tão mediáticas Transições? Tunísia? Egipto? Líbia? Iémen? Síria? Jordânia? Marrocos? Bahrein? Argélia? Para espanto do Fidalgo as transições ocorreram em poucos destes países na verdade. Eu explico!

Para Lahbib Choubani, Ministro para as Relações com a Sociedade Civil e com o Parlamento (curiosa nomenclatura), em Marrocos não se assistiu a uma Transição mas antes a uma Evolução gradual, no quadro das instituições e com o papel muito activo de SAR Mohammed VI. Aliás os vários delegados vindos de Marrocos elogiaram, quase em uníssono, o papel de Sua Majestade na Evolução de um país que assim rejeita ter entrado na Parada da Transições Árabes.

Para SAR Rym Ali e para Kariman Mango, vindas da Jordânia, o reino não passou por qualquer Transição mas antes por uma fase de Transformação. E no mesmo sentido os representantes da Argélia falam em Adaptação e não em Transição. E, de uma assentada, a lista de Transições que parecia tão vibrante é encurtada em 1/3.

Magda Eltouny (Liga Árabe), Touhami Abdouli (Tunísia) e Bothaina Kamel (Egípto) concordam que no Egipto se pode falar de Transição. A Tunísia não tem, de resto, tentado monopolizar o vocábulo, mas faz questão de lembrar que tudo começa por aqueles lados. No Egipto falam em transição tri-faseada: 1.) derrubar o Presidente Mubarak; 2.) afastar o Conselho Militar; 3.) depor o Presidente Mursi.

Do Bahrain e do Íemen pouco se falou, nem sequer representantes tinham. Da Síria nem uma palavra, nem um qualificativozinho, para aquela que é uma Guerra Civil, com culpas nos dois lados da trincheira. E, para meu espanto, como que para substituir o Bahrain e o Íemen estava presente um representante da Palestina (que recentemente fez upgrade ao seu status internacional) que veio agradecer o voto de Portugal... Num Fórum sem representantes de Israel...

No meio de todas as discussões sobre que palavra usar para qualificar o momento em causa perdeu-se uma boa oportunidade, com muita gente de Alto Nível, para compreender a fundo o que está acontecer no espaço Árabe; para compreender sucessos e aceitar derrotas; para compreender processos, dinâmicas e métodos. Perdeu-se substância para a linguística... Que não sendo irrelevante, não releva a real dimensão da questão em análise.

Assim se percebe o tempo que as decisões demoram a tomar, quando dois dias servem para discutir como discutir a questão. Quando o produto de um Fórum que reuniu tanta gente interessante foi um não-produto. Quando o máximo que se conseguiu alcançar foi no domínio Nominal... Pois no domínio Substancial de nada, ou quase nada, serviu o Fórum...


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