Estou de partida, sem ter chegado a lugar algum. Estou de
partida, enquanto olho paisagens esborratadas pela velocidade e enegrecidas
pelo sentimento. Estou de partida, quando queria chegar a um lugar que não
existe, que se sente mas não se apresenta. Estou de partida, e tenho que sorrir
se chorar eu não quiser. Estou de partida, levando na memória sons e vivências que
ainda não aconteceram.
Estou de partida, pois não cheguei a realizar-me; não
deixei de ser partícula onírica; não deixei de ser uma probabilidade, uma
possibilidade, uma eventualidade. Estou de partida porque sim, e mais nada! Estou de partida, pois quando chegar terei que continuar a percorrer esta longa estrada.
Estou de partida sem sair do mesmo lugar. Tal como estou em pé, mesmo
quando eu me sentar. Sou um redemoinho de contradições e parto deste sítio, onde
nunca cheguei. Estou de partida, buscando essa chegada; atendendo uma chamada
que um dia se fará. Estou de partida agora, porque prefiro o já, ao lamento da
demora.
Estou de partida mas deixo-me ficar. Deixo réstias de mim,
retalhos da manta da minha existência, pedacinhos pequeninos da minha essência
que implantei por aí. Estou de partida, sem ter pensado uma chegada, apesar de ter
gravado, na mente, a morada de onde saio. Estou de partida por agora, pois
quero ver se chego em Maio.
Estou de partida, por evidência, e deixo de clamar assim. Estou de partida, minha querida, não precisas esperar por mim. Porque quem
parte também chega; quem parte também te aconchega; quem parte está perto de
ti. Olha ao espelho e sorri e verás que estou aí; e que mesmo estando de
partida estou já de chegada… E mesmo quando parto sabes estarei à tua beira... a
ver-te dormir…
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