Já vi este filme e não gostei...

As notícias têm sido muito claras, a marcha eleitoralista falhou na República Democrática Congo (estado cujo o nome é aliás de uma ironia suprema). Realizaram-se eleições que não cumpriram os requisitos mínimos estabelecidos pela Comunidade Internacional para um sufrágio "transparente". E obviamente que os resultados, que beneficiam o Presidente Kabila, desagradam à oposição que veio para as ruas...

A violência não se fez esperar e o Congo, que no seu nome se assume Democrático mas na sua prática está longe de o ser, mergulhou num espiral de tensão que pode degenerar em confrontos violentos ou, e não será exagero dizê-lo, em guerra civil. Relembra-me tudo isto o que ocorreu na Costa do Marfim, o ano passado, quando o processo eleitoral presidencial degenerou numa guerra civil entre os dois candidatos (Ouattara e Alassane).

Com o fim da guerra, Alassane, que granjeou mais apoios na Comunidade Internacional, manteve-se na frente dos destinos do país e viu-se obrigado a criar uma Comissão de Reconciliação, como forma de evitar a implosão social de um país que é, em boa parte, uma ficção do colonialismo europeu. A violência dos actos foi tal que no acto eleitoral legislativo que hoje se desenrola a participação registada é baixa. Medo de um remake indesejado? Ou acalmia antes da nova intempérie?

O Congo, que se diz Democrático, acaba por parecer-me a imagem plasmada deste mesmo problema... E não são estes os únicos estados que provam, preto no branco, que entender democracia apenas como um sistema que se apoia em eleições sistemáticas não só deturpa o sistema, como o fragiliza. Democracia é um regime político que se deve alicerçar em valores multidimensionais abrangentes e inclusivos.

As eleições no Congo, e as suas consequências, provam, uma vez mais, que é tempo de se repensar África. É hora de se olhar para as fronteiras de África e ter a coragem política para redimensionar estados, eliminar estados, construir estados, fundir estados, cindir estados. Fazer o que for preciso para trazer sanidade, a uma situação mantida pela insanidade das elites políticas locais e pela "cegueira selectiva" da comunidade internacional.

É tempo de corrigir erros, ao invés do eterno jogo de "apontar o dedo"! SIM, a culpa do mapa político africano é europeia, é da Conferência de Berlim. Mas a verdade é que os líderes políticos africanos não foram capazes de chegar a consensos e de desfazer alguns desses erros, empurrando com as suas barrigas os problemas para a frente; para um próximo que há-de vir. E mais verdade ainda, que esta mania de culpar A, que culpa B, que se descarta em C, que aponta o dedo a D, não resolve problema nenhum.

A Academia tem aqui um papel crucial para revitalizar conceitos, construir novos modelos de análise e reflectir no desenho de novos mecanismos de actuação política adaptados às exigências do século XXI e aos ambiciosos compromissos internacionais que se vão assinando (Acordo de Durban, Declaração de Busan, Objectivos do Milénio). Ou queremos continuar a assinar, por assinar? A assinar por uma fotografia, uns aplausos e uma jantarada?

Fica o repto...


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